Fragmento!

(…)

Faz um flashback,
recolhe do passado
os retalhos amassados,
cerzidos em sentimentos sagrados,
os seus momentos válidos
e na somatória com os de agora
recomece sua história:
junte suas asas
às do pensamento
e voe,
perdendo-se pelo arrebol.
Veja de perto o pôr do sol
e o nascer de um novo dia.

(…)

Prece!

Aquieta meu coração, Senhor!
Com rebeldia,
ele me impõe ritmos,
acelera os batimentos,
expande-se e se contrai
à minha revelia.
Sinto-o atrapalhando
meus passos,
invadindo meus sonhos,
entorpecendo meus músculos.
Nas horas de maior silêncio
ele grita,
indiferente aos meus apelos:
cobra-me atitudes,
impõe sua vontade e desejos.
Assustada,
peço-lhe que se cale.
Ele ri de mim,
dos meus medos inúteis,
dos meus segredos antigos.
Meu coração tiraniza meus dias.
Faz-me exigências
e me indaga,
até quando eu o manterei prisioneiro.
Nos fins de tarde,
cansado de lutar comigo,
ele se entristece
e, com uma voz doce,
quase inaudível,
suplica que eu o liberte.

No Limiar da Vida!

Fiquei:
nas reticências
que indeterminam a vida,
nas frases mal formuladas,
indefinidas;
fechada,
entre parênteses,
nos limiares das portas,
nas perguntas sem respostas.
Fiquei:
robotizada pelas conveniências,
confinada nos constrangimentos,
alienada a sapiências radicais,
enroscada em normas preestabelecidas,
estereotipada por padrões tradicionais.
Fiquei:
paralisada em becos sem saídas,
pés no chão,
vontade de voar,
vendo os sonhos
se distanciarem livres,
sem poder partir
para os alcançar.
Fiquei:
em uma esquina qualquer,
esquecida,
nem um raio de luz a me brilhar,
onde o verso tropeça
e muda de destino,
onde a poesia jamais irá passar.

Depois do Vendaval!

Depois do vendaval,
a vida se anuncia:
renasce com o sol
que traz a luz do dia,
o silêncio da prece,
paz que prevalece,
o odor das flores
a revelar caminhos.
Revoada de pássaros
a refazer seus ninhos
e a esperança louçã
de se acreditar de novo,
no novo,
no amanhã.
Mistério a desvendar,
desbravar.
Quem sabe um bem guardado,
ou suposto legado.
Ah, não fosse o amanhã!
Não fosse o tempo,
senhor da razão,
que, com sabedoria suprema,
é bálsamo que alivia:
distanciando saudade e dor.
Os gritos amordaçados,
lágrimas e apelos
perdem força:
são amenos
até se dissiparem
ao vislumbrar salemas.
Depois do vendaval,
a brisa sopra leve
e descreve a rota dos sonhos
que caminham sobre as águas,
dantes turbulentas,
agora tranquilas e serenas.
Depois do vendaval
tudo volta ao normal:
vai a noite,
vem o dia,
cotidiano e fantasia
até o próximo temporal.

Mãe: saudade eterna!

Rio!

(…)

Quero:
ser rio que chega ao mar
vencendo as batalhas
de seu fluxo
ao tornear pedras,
colidir em rochas,
modelar-se à opressão das margens,
nortear as águas durante seu percurso,
único recurso para estancar a sede.

Subentendido!

Não explico a ausência.
Deixo rastros de resiliência
em sonoro silêncio
a ecoar de mim.
Disfarço minha tristeza
e grito em versos ritmados
cada linha que traço.
Não proclamo o amor.
Está explícito no que faço
e se não faço,
não há.
Não aponto caminhos.
A cada um cabe o seu.
Toda escolha, um dia,
leva ao mesmo encontro.
Não exacerbo o certo
nem restrinjo o errado.
As duas medidas pesam
em diferentes balanças
e a cada uma o seu conceito:
vale deixar subentendido
o que ainda pode ser feito.
Não dito regras nem as formulo.
Cada coração rege seu rumo
e à razão é dado o veredicto final.
Consequência é resultado de toda ação.
Só sei que nada sei
e o não saber
subentende-se:
explora o que não há.
Não apregoo a alegria,
nem descrevo o meu pranto.
Dissimulo a beleza
da poesia dos cantos.
Minh’alma procura mostrar ou
subentende-se em meu olhar.

O Poeta Chora!

E o poeta chorou!
Chorou pelo que podia ser
e não foi.
Por tudo que cultivou
e não deu.
Pela flor que poetizou
e morreu.
Chorou pela insensatez,
pela aridez que se assolou,
pela pequenez que se inflou,
combalido mais uma vez
por ter perdido o sentido
de tudo aquilo que fez.
Pela esperança equilibrista,
pelo fim do show do artista,
pela crueza fria que se estabeleceu,
pela paz que o mundo,
um dia,
creu.
Chorou convulsivamente
de uma só vez,
como uma criança
que, sem nada entender,
precisa, de repente, crescer,
castigada pelo que não fez,
esquecendo-se da bala que a amargou,
para encarar o mundo mau que hoje se instalou.
E o poeta chora!
Fora vencido nessa hora.
Chora por mim,
por você,
pelo que sonhou.
As lágrimas são palavras
que não quer dizer
agora.

Entrega!

Entrego-me ao crepúsculo das horas,
ao tempo que não se demora,
ao sonho impalpável irrompido da aurora
onde minhas mãos resvalam,
tremem,
teimam,
demoram
pelo cansaço da persistência.
Entrego-me ao intransitável,
às lonjuras sem demarcação
a transitar minha existência, minha solidão.
Às veredas purpurizadas,
aos canteiros de jasmins,
às belezas não sondadas que não vejo,
mas que existem sim,
aos sonhos interditados
sem avisos nem porquês,
ao desejo de ir,
apesar de.
À sensação de que vai passar
e permanece,
sem trégua,
em mim.
Aos mistérios a rondar,
ao ter que crer sem ver
e ninguém para revelar.
Ao definitivo do não eterno,
à certeza de haver um fim,
às perguntas sem respostas.
Meu silêncio a gritar
e ninguém a me ouvir.

Mundo Paralelo!

Então perco o chão
na transcendência,
eloquência
e impaciência
de levar meu imaginário
(sem elo)
a um paralelo
mundo são.

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