Aparta-se dos sonhos.
Acomoda-se na angústia de ser quem não é.
Deixa que a fragilidade se expanda como quiser.
Não sabe como torná-los palpáveis.
O medo de parecer diferente,
destoar-se perante toda a gente
vivendo a mesmice peculiar do lugar
ganha a frente, imponente.
Entrega-se ao pleonasmo repetitivo de dias iguais.
Desiste dos sonhos.
Sonhar jamais!
Tranca-os em uma gaveta de medos.
Seus sonhos,
seus segredos,
seus enredos.
Há tanto dentro dela.
Palavras que jamais foram ouvidas
ditas no silêncio que gritava,
ao vento que passava
e parava para escutar.
Ao tempo que em veloz andança
abraçava a marcha lenta
dando tempo ao tempo
na esperança de mudança
da utopia em realidade.
Talvez um dia a gaveta se abra
(e venha à tona a verdade)
pelo acúmulo de sonhos guardados,
sufocando os medos,
revelando segredos
e os caminhos se esparjam
dando passagem aos enredos.
mar 04 2021
Devaneios!
mar 04 2021
Tu podes!
Poetiza-me.
Deixa-me respirar teus versos.
Livra-me dos poderes adversos.
Percorre meu interior.
Descreve-me em toda versão.
Divulga-me assim.
Mora na calma da paz de um coração
a pulsar, das manhãs, a canção.
Vive teus momentos em mim.
Inspira-te em sentimentos que falam
do amor que evolui e constrói.
Reconstrói-me.
Sou fruto de sensibilidades,
poço de fragilidades
que se apropriam de essências
geradas no cerne da alma.
Leva-me em tua poesia
onde a magia faz crer
que o inadmissível estarrece
e o impossível acontece.
Carrega-me, entorpecida bailarina
a deslizar no inusitado de tuas rimas.
Cerra a linha do tempo
e que nos leve os vendavais
a ancorar nos sonhos atemporais.
Tu, só tu podes,
poeta.
mar 04 2021
Hoje!
Fico aqui e deixo o mundo para lá.
Estática, vejo-o rodar.
Livre, com a sensação de não estar.
Leve e a impressão de levitar.
Ser (im)pensante,
esquecida do instante,
Isolada do que não posso transformar.
Volto-me para mim.
Sou corpo no vácuo
despejado por alguma turbulência.
Não clamo por sobrevivência.
Não chego a ser pânico nem solidão.
O meio termo define meu padrão.
Hoje tiro os pés do chão.
Afasto-me do mundo,
dou meia volta,
driblo os solavancos,
os engodos,
a revolta.
Sou meu próprio piloto
a resgatar micropartículas de mim.
Que a física quântica,
o poder do pensamento
ou tudo o que nos conduz,
façam prevalecer suas leis,
sem distâncias ou anos-luz,
e acelerem a teoria do fim.
(Ou recomeço.)
mar 04 2021
Busca!
Busquei na transparência da manhã
motivos para desencadear o riso
ante a melancolia exposta em cada rosto,
a reviravolta de um ideal deposto,
como se fora um grito de agonia,
um pedido de socorro,
uma premonição,
um aviso.
Busquei no matiz das cores
flores para enfeitar o dia,
mas o encanto se murchou
junto à flor mais recolhida,
perfume a desimpregnar rancor
diante do desencanto da aflição,
e olhares perdidos na mesma direção.
Busquei levar consolação,
porém o desconsolo fez-se solução
e meu alento para mim voltou
feito flecha a penetrar o coração
sangrando a liturgia da doce ilusão.
Ideologia não se muda da noite para o dia,
não se vende feito peça de leilão.
Eis a questão.
Busquei falar através de versos,
da poesia que canta o perdão
e acalanta os reversos
restaurando a união,
mas o coração machucado
jamais ouve qualquer canção.
Recorro ao tempo.
Nele busco compreensão,
o amor que se desfez ao vento,
a paz que reina na exclusão,
e retornarão em uma manhã
banhada de luz e recomeços,
no silêncio da oração.
mar 04 2021
Quase!
Quase me deixei levar
sem ponderar o certo ou o errado,
mas o destino tinha o não tramado
e entre o certo ou errado
o nada aconteceu.
Quase gritei meu sentimento
no ápice das emoções incontroláveis,
mas fiz falar o meu silêncio.
Retrocedi ao arrebatamento.
Quase consumei cada momento
a crescer na volúpia do voraz desejo,
no ensejo de mostrar o meu avesso,
mas tropecei na incontida urgência
de me despir em fatos e argumentos.
Quase me opus ao tempo
pedindo-lhe um contratempo,
um flashback,
um alento.
Voltar à flor do passado
colocada sobre teu teclado
em um gesto de ternura,
impensado.
E olhaste o meu olhar desviado,
calado,
querendo falar alto.
E me perdi no quase,
sem jamais me ter achado.
mar 04 2021
Navega!
Vai,
adentra as brumas do oceano,
desvenda-lhe os mistérios,
arranca-lhe os panos,
envereda em seus encantos
reais e surreais,
constrói os seus castelos,
povoa-os de ideais
e volta para me buscar.
mar 04 2021
Talvez!
Talvez
o tempo reverta
a descrente esperança
em certeza
e me traga a surpresa
de um bem inesperado
que nem sempre se alcança.
Ou o amanhã retroceda
ao ontem ininterrupto
que se estende ao futuro.
Caminho escuro.
E tudo fique na mesma.
História que tento mudar,
rima que não quer mais rimar,
poesia que já não se faz notar.
Enfatizada,
mastigada,
engasgada.
Talvez
o hoje vivido
tenha valido
uma eternidade
e meu eu distraído
não tenha medido
tanta felicidade.
Nem notou as manhãs
de belezas louçãs,
momentos desprezados
na espera do amanhã
que talvez nunca venha
ou se faz de rogado.
Talvez
esses versos piegas
sejam fiéis mensageiros
do tempo verdadeiro
e mensagens sinceras
carregando bagagens
de sonhos e miragens,
gerúndio se estendendo
em todos os tempos
trazendo-me a chance
de continuar sendo,
mesmo em um tempo já ido,
mesmo sem nunca ter sido.
mar 04 2021
Mundo!
Sem passaporte,
confiando na sorte,
meio que se atropelando
entre atropelos vagando,
junte o que pode juntar
e se embrenhe pelo mundo
vasculhando o vazio e o fundo,
indo aquém e além
do que se possa imaginar.
Caminhadas aceleradas,
um ir e vir sem definição,
sem mudanças,
mesma direção.
“Mens(in) sana in corpore (in) sano”
pisando o sagrado,
driblando o profano,
finitos e infinitos superando
sempre viajando,
perdendo-se em labirintos,
achando-se em círculos,
movimentos cíclicos
que levam ao mesmo lugar:
da chegada,
da partida?
Quem há de saber?
Tanto faz!
E nessa roleta-russa
denominada vida,
há o certo e o incerto
e também a sobrevida.
Um jogo de azar,
a bala não perdida,
cartada preestabelecida,
vitória favorecida.
Sorte?
Única certeza:
Morte!
mar 04 2021
Sonho!
Era um sonho inatingível,
fora da realidade,
das possibilidades
de quem só sabe sonhar.
Trancado à sete chaves
em um cofre no fundo do mar,
um mundo à parte
imergindo dons de voar,
desses que ninguém invade
sem estar apto para tanto,
guarnecido de encantos,
de sentimentos tantos
nascidos do âmago para se soltar
e chorar pelo que não pode,
pelo que não coube
e teve que calar
tal a vastidão de seu penar.
Era um sonho inatingível,
praticamente impossível
de se realizar.
Virar poeta da noite para o dia,
perseguir a utopia
que não se deixa tocar.
Se tocada perde a magia
e o sonho vem a desabar.
Inatingível.
Mas era um sonho.
Não podia esmorecer,
cair em abandono,
desvanecer
sem ter visto o sol
do alvorecer,
beijado a nostalgia
do entardecer
sentido a primavera nascer.
Não podia morrer.
Deixar o poeta
de mãos vazias,
atadas
e a alma repleta de poesia,
mutilada.
Inatingível,
mas não impossível.
Bastaria acordar e buscar.
mar 04 2021
Escrevivendo!
Escrevo o dia que se abre
e toda a sensação que me invade
ao sentir que nunca é tarde
e a vida me chama para recomeçar.
Escrevo o ato que se predomina
ao escrever definitivamente o fim
ou inevitavelmente o começo
e tende a se emaranhar nas entrelinhas.
Escrevo o crível do tosco monjolo
ao debulhar com arte o milho e o café.
Escrevo do que vejo o que me convier,
o que ficou marcado no profundo,
lá nos guardados de meu mundo.
Escrevo sentimentos,
razão de minha fé,
arquivados onde, às vezes, mora a dor
e só vêm à baila no momento exato
em que se rompe o extravasor.
Escrevo,
descrevo,
reescrevo
a minha própria vida
onde minh’alma está contida.
O ontem,
o agora,
talvez o depois.
O instante em que vivo agora,
o convívio entre nós dois,
as lembranças do outrora,
o tempo que me desafia.
O resto, escreve a poesia.